Crônica: Estudo sobre a solidão.
Um cachorro de rua é solitário. Solitárias são as pessoas que esperam seus ônibus no ponto. Todas elas. De certo que todo mundo é um pouco triste e um pouco só mesmo. A solidão está num canto vazio do seu guarda-roupa, numa lembrança que se perdeu no meio de tantas outras, é o último gelo da cuba, uma peça empoeirada na prateleira de uma loja. A solidão é um livro mal apresentado, é um poste só numa rua vazia, é a luz dele enfraquecendo. A solidão está no seu reflexo no espelho, está na cor da sua pele, ou num casamento de quinze anos. A solidão é um relógio às três da madrugada, é quando não há nenhuma estrela e nem uma lua no céu. A solidão é uma oração desesperada, é um momento insólito de concentração. A solidão é uma senhora que se alimenta do desengano, é um castigo dado a qualquer pessoa. A solidão é uma criança me pedindo comida no centro da cidade, é o desprezo na indiferença de quem não liga para você. A solidão está naquela música que se escuta quando está chovendo. É ver as coisas passarem pela janela do ônibus. A solidão tem efeitos colaterais também, geralmente fica na garganta, é amarga e chorar é um pouco doloroso. É o oposto de dever cumprido. A solidão está na ideia de que tudo passa e as pessoas são temporárias, como uma placa de vende-se ou aluga-se colada na parede de uma casa por anos. É tipo o último dia de aula, e depois ninguém sabe mais o que fazer. A solidão está em momentos de epifania, está no chão que você pisa, na água suja da roupa que você lava, num corredor de supermercado, no cansaço do fim do dia, está na sua busca por espaço.

A solidão é um dar de ombros do mundo para você e de você de volta para o mundo.
Nota do autor: possuo um blog de crônicas também!
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